terça-feira, 19 de agosto de 2008

Do filme "O sétimo selo", obra-prima de Ingmar Bergman:

– Quero confessar com sinceridade, mas meu coração está vazio. O vazio é um espelho que reflete o meu rosto. Vejo minha própria imagem e sinto repugnância e medo. Pela indiferença ao próximo, fui rejeitado por ele. Vivo num mundo assombrado, fechado em minhas fantasias.
– Agora quer morrer?
– Sim, eu quero.
– E pelo que espera?
– Pelo conhecimento.
– Quer garantias?
– Chame como quiser. É tão inconcebível tentar compreender Deus? Por que Ele se esconde em promessas e milagres que não vemos? Como podemos ter fé, se não temos fé em nós mesmos? O que acontecerá com aqueles que não querem ter fé ou não têm? Por que não posso tirá-Lo de mim? Por que Ele vive em mim de uma forma tão humilhante, apesar de amaldiçoá-Lo e tirá-Lo do meu coração? Por que, apesar de Ele ser uma falsa realidade, eu não consigo ficar livre? Você me ouviu?
– Sim, ouvi.
– Quero conhecimento, não fé ou presunções. Quero que Deus estenda as mãos para mim, que mostre Seu rosto, que fale comigo.
– Mas Ele fica em silêncio.
– Eu O chamo no escuro, mas parece que ninguém me ouve.
– Talvez não haja ninguém.
– A vida é um horror. Ninguém consegue conviver com a morte e na ignorância de tudo.
– As pessoas quase nunca pensam na morte.
– Mas um dia na vida terão de olhar para a escuridão.
– Sim, um dia.
– Eu entendo. Temos de imaginar como é o medo, e chamar esta imagem de Deus.
– Está nervoso.
– A morte me visitou esta manhã. Jogamos xadrez. Ganhei um tempo para resolver uma questão urgente.
– Que questão?
– Minha vida tem sido de eternas buscas, caçadas, atos, conversas sem sentido ou ligações. Uma vida sem sentido. Não falo isso com amargura ou reprovação, como fazem as pessoas que vivem assim. Quero usar o pouco tempo que tenho para fazer algo bom.
– Por isso jogou xadrez com a morte?